Num espaço temporal de uma semana, dois assassinatos ganharam repercussão nacional. No último dia 24 de fevereiro, o congolês Moise Kabagambe foi brutalmente espancado até a morte na cidade do Rio de Janeiro. E também no Estado Rio, o trabalhador e pai de família Durval Teófilo Filho, que voltava do trabalho, foi alvejado por três disparos de arma de fogo.

 
Moise Kabagambe 

Segundo informações, no primeiro caso, Kabagambe fora até o local de sua execução cobrar diárias de um trabalho que, provavelmente, não tinha nenhum registro, nenhuma garantia trabalhista. No segundo caso, Durval simplesmente foi comparado a um bandido pelo seu executor que desferiu três tiros na vítima que, segundo depoimentos, avisou desde o primeiro disparo que era morador do mesmo condomínio.

 
Durval Teófilo 

Em ambos os casos, a pele negra está presente de forma passiva e como vítima de entendimentos de terceiros. No primeiro, trata-se de uma pele negra de além-mar que saiu de seu país de origem fugindo dos horrores de uma guerra. Moise levou socos, pontapés, pauladas e foi "finalizado" com um golpe da arte suave (jiu-jitsu) que o aplicador disse estar com a consciência tranquila. No segundo caso, a pele negra brasileira que chegava do trabalho fora do horário comum da maioria dos trabalhadores e que provavelmente não ocupava um gabinete confortável e com ar-condicionado, foi executado, mesmo dizendo que era morador, logo após o primeiro disparo. O atirador disse que agiu em legítima defesa, ou seja, aquela em que o ordenamento jurídico permite causa culposa ou até excludente de ilicitude, quando o agente repele injusta agressão atual ou iminente. Repito, Durval avisou que era morador, logo após o primeiro disparo.

Os dois episódios trágicos mostram a estruturação racista que existe em solo brasileiro e pela qual a carne negra segue sendo a mais barata e a mais vulnerável. Pelos relatos, Moise Kabagambe sobrevivia de bicos, ganhando por dia trabalhado, sem vínculo empregatício. Já Durval Teófilo trabalhava em um supermercado, em Niterói, não sei ao certo em qual função, porém estar à margem dos grandes cargos é uma característica do racismo que está impregnado na teia social brasileira.

Como disse Jorge Aragão na música identidade, diante desse fator real da nossa história, até quando o negro será alvo das agressões promovidas pelo racismo?